O planejamento é essencial ao desenvolvimento de qualquer atividade, principalmente quando falamos de gestão pública. O Governo de Roraima apresentou por mensagem governamental, um plano de desenvolvimento sustentável, denominado Roraima 2030. A justificativa apresenta 7 eixos estratégicos orientam a construção de um novo Estado, primando pela promoção do desenvolvimento sustentável, considerando os aspectos ambientais, econômicos e sociais.
A proposta construída nos frios corredores da gestão governamental não foi elaborada com transparência, muito menos, escutando segmentos sociais que poderiam protagonizar contribuições para um multifacetado planejamento pautado na inclusão cidadã e combate as desigualdades. Os primeiros 4 anos de administração do Estado, sob gestão da aristocracia agrária liderada por Denarium, vemos a concentração de atividades econômicas, desregulamentações na área ambiental e a centralização dos investimentos em grandes empreendimentos que potencializam o latifúndio e a monocultura.
O projeto apresentado, a casa legi$lativa, apresenta 4 diretrizes contemplando: a) fortalecer as condições econômicas e sociais com foco no desenvolvimento sustentável e bem-estar da população; b) melhorar o processo de gestão e transparência das ações públicas; c) promover soluções inovadoras para aproveitamento sustentável das riquezas, potenciais naturais e condições produtivas diferenciadas; d) melhorar a qualidade de vida dos habitantes por meio da oferta adequada de segurança, educação, saúde e outros serviços. O planejamento consiste na execução de responsabilidades impostas pela Lei, não rupturas com o estado de exclusão social que vivenciamos.
Os eixos que orientam as proposições foram agrupados em gestão econômica, desenvolvimento sustentável, saúde, bem-estar, educação, segurança e infraestrutura. A proposta de Denarium considera as ações apresentadas como ferramentas estruturantes, perpassando por diversas estruturas da administração pública – o problema é concatenar com os interesses dos donos das pastas, distribuídas a empresários e políticos. A condução dos processos será feita de forma centralizada, não apresentada a forma na proposição.
O eixo gestão econômica propõe melhorar o ambiente de negócios – realmente a gestão Denarium transformou a gestão pública em um espaço de negócios familiares e empresariais que promove o aumento da pobreza no Estado e as denúncias de corrupção. Os objetivos concernem puramente na consecução das obrigações do Estado, já assumidas junto ao Governo Federal e a Constituição Estadual, sendo: modernizar a gestão pública; promover o equilíbrio e a sustentabilidade fiscal; e aprimorar a governança.
Um planejamento na área da gestão econômica teria que enfrentar a desregulamentação de subsídios, incentivos e desonerações concedidas pelo Governo, necessitaria promover a desconcentração dos investimentos dos grandes empresários para pequenos produtores agrícolas, além das micro e pequenas empresas, com objetivos e metas que permitissem a inclusão de vários segmentos produtivos excluídos das políticas econômicas do Estado. Mas, para o primado da gestão de Denarium, o que vale é financiar os grandes, os ricos, enquanto a classe trabalhadora segue sendo explorada, muitas vezes sem direitos trabalhistas algum. A proposta neste eixo consiste em realizar as obrigações legais já impostas ao poder público, de gestão econômica não possui nada.
O segundo eixo a ter seu objetivos e indicadores apresentados é o do desenvolvimento sustentável, os quais dividem-se em: impulsionar o desenvolvimento econômico-ambiental do Estado; fortalecer setores produtivos estratégicos; construir e consolidar conexões com mercados globais. Neste tópico não percebemos nenhuma inovação além da política de fomento à produção de grãos e carne, além da sanha extrativista de minerais. Não se apresenta nenhuma perspectiva concreta que promova a inclusão, mas sim, potencializa os setores “estratégicos”, os quais não são apresentados.
A proposta parece buscar consolidar a base legal da sanha empresarial de Denarium que tem usado o cargo de Governador para tentar negociar os produtos de seu frigorífico, o Frigo 10. A centralidade na exportação de carne é uma das prioridades do Governo em seus encontros internacionais. Lembro aqui, a todos e todas, o mal imposto pelo monopólio do frigorífico dos destruidores ambientais, o preço do boi em pé tem imposto ao pequeno produtor desestímulo a continuidade da criação de gado, enquanto as terras e fazendas dos 10 oportunistas, da empresa, só crescem, nós pagamos a conta.
O eixo da saúde reproduz as obrigações previstas na Lei 8080/1990. Os objetivos consistem em: garantir a integralidade da assistência, com atendimento humanizado; promover o planejamento regional integrado da saúde; e implementar a educação permanente em saúde. A realidade que vivemos atualmente na saúde percebemos que o governo, não prima por esses objetivos, basta vermos as filas, as mortes e a ampliação da desassistência da população do interior do Estado.
Uma boa proposta seria promover a informatização e integração entre os três níveis de atenção, isso seria um passo importante, bem como, o fortalecimento da atenção primária com coofinanciamento do governo estadual. Em 4 anos pioramos o acesso aos serviços de saúde, mesmo com a dinheirama destinada a pasta, não será com a proposição de objetivos que legalmente já deveriam ser observados que construiremos a melhoria da atenção à saúde.
Principalmente quando vemos o objetivo do Governo de terceirizar a gestão das unidades de saúde do Estado, sem nem consultar a população, e pior, colocando sigilo sobre o processo. Como teremos os recursos de nossos impostos sendo destinado a terceiros, em valores que representam 30% do atual orçamento da saúde para 2023, sem nos consultar. É necessário no mínimo a realização de uma consulta pública, a delegação do poder ao executivo, não consiste em um cheque em branco para gastar os recursos como quer o fazendeirinho.
O cúmulo do absurdo é apresentado no eixo bem-estar. Quando o objetivo central é o empreendedorismo social, algo que poderia se encontrar no eixo gestão econômica. Apesar do olhar central ser o “empreendedorismo” as ações pautam-se em: qualidade de vida; reintegração e dignidade; trabalho e renda; cultura e esporte, segurança alimentar e nutricional. As ações condizem melhor com o eixo. A dúvida é o que determinará a implementação de políticas públicas, o objetivo ou as ações propostas? Se as ações, como ela coadunará relação com o empreendedorismo social?
A redução das desigualdades pauta-se, conforme estabelece o parágrafo primeiro do artigo 17, na autonomia do indivíduo mediante serviços assistenciais. A assistência é fundamental a garantia de bem-estar numa sociedade em que 52% das pessoas sobrevivem com menos que ½ salário mínimo, porém, não pode ser o principal programa do Estado. O incentivo à produção da agricultura familiar, a criação de pequenas agroindústrias e linhas de financiamento são ações sólidas, ao serem integradas a processos de qualificação profissional e políticas de aquisição de produtos pelo poder público e a iniciativa privada.
Um exemplo aqui importante é o cumprimento da Lei 215 que concede incentivos fiscais do Estado com renúncia de taxas e impostos. A normatização exige que os contemplados com a benesse da sociedade, concedida pelo Estado, tenha como compromisso a geração de empregos. Ocorre que muitos dos trabalhadores são trazidos de outras regiões do país no período de plantação e colheita de grãos. Claramente vemos uma política de Estado que não cumpre sua função social para o povo que a financia. Quando fala no tocante a reintegração e dignidade, o governo estadual, não menciona políticas específicas as mulheres violentadas e abusadas em suas casas, primando pela reintegração às famílias de crianças e jovens vítimas de violação de direitos. Um ponto importante é que as ações, ao menos no papel, incorpora um olhar do Estado aos imigrantes.
O eixo educação preconiza garantir acesso à escola e à educação, especialmente aos “menos favorecidos” – não consigo entender o que significa isso – e as pessoas com deficiência. A proposta abrange a educação básica, profissional e superior, focando na valorização profissional e no multiculturalismo. Como implementar valorização profissional com a fragilidade na forma de contratação dos profissionais da educação seja por hora aula ou terceirização?
Os objetivos propostos preveem: garantir o desenvolvimento escolar para todos; universalizar a educação superior; e valorizar os profissionais da educação. Em nenhum momento a proposta foca no combate à evasão de jovens do ensino médio, apesar de apresentar que buscará as condições dignas de permanência e aprendizagem. Quais essas condições dignas de permanência? Vincula a educação superior exclusivamente a inserção de jovens no mercado de trabalho, não a promoção da produção de conhecimento e pesquisas, sendo mais um ponto fora da curva na proposta apresentada. A valorização profissional é apresentada apenas sobre a perspectiva da qualificação continuada, não da modernização de nossas escolas para melhor desenvolvimento e vivências nos estabelecimentos de ensino e valorização salarial dos servidores públicos.
A segurança pública é referenciada como um eixo estratégico, no intuito de promover a proteção da sociedade, com respeito à dignidade humana e à cidadania. Os objetivos estabelecem: oferecer segurança pública de excelência; aprimorar a segurança no trânsito – essa uma competência municipal – garantir um sistema penitenciário equilibrado e controlado. Uma dúvida é qual a compreensão de excelência do governo. Será que a abordagem de homens negros, indígenas ou imigrantes nas ruas quando andam de bicicleta é excelência ou preconceito?
O fortalecimento da polícia técnica – onde famílias do interior passam horas com corpos estendidos pelo chão esperando a chegada de profissionais da polícia técnica – e o combate ao crime organizado não é apresentado como uma necessidade urgente do nosso Estado. O equilíbrio e o controle do sistema prisional objetiva prevenir distúrbios e promover a reintegração do apenado, ocorre que não são apresentadas estratégias que permitam essa reinserção, por exemplo com cotas de contratação junto as empresas que prestam serviços ao poder público.
O eixo infraestrutura consiste em um olhar para 3 setores, estabelecendo os objetivos: viabilizar a estruturação, ampliação e o aprimoramento dos serviços de energia elétrica, água, esgoto e comunicação; estruturar e ampliar a malha viária do Estado; e estruturar os transportes intermodais. Quando fala de energia preconiza-se a expansão da rede – responsabilidade da empresa privada detentora da concessão, não do governo do Estado – e priorização de energias renováveis, infelizmente não foi isso que vimos na atuação do Governo no edital de licitação da ANEEL em 2019, priorizou-se energia fóssil por termoelétrica, inclusive a primeira termoelétrica a lenha da Amazônia.
Quando fala de água potável preconiza apenas a qualidade, não assume responsabilidade em garantir quantidade adequada, muito menos em desenvolver ações de proteção de nossos mananciais superficiais e subterrâneos. No tocante ao esgoto não proporciona a operacionalidade dos sistemas deficientes das sedes municipais do interior do Estado, apenas genericamente aponta a melhoria do serviço.
O turismo, grande saída econômica para geração de emprego e distribuição de renda é apontado apenas quando se fala da ampliação da rede viária, demonstrando a centralidade da proposta na ampliação da produção de grãos e criação de gado, atividades centralizadoras de riqueza, ao contrário do turismo em suas diversas formas de organização. A estruturação dos transportes intermodais é pensada para transporte de pessoas e cargas oriundos do país e de fora. Na proposta não se pensa a garantia de transporte as pessoas do Estado.
A proposta abre caminho a privatização de serviços públicos ao regulamentar que para implementação dos objetivos, o Estado poderá firmar parcerias com a iniciativa privada nacional ou internacional. A exemplo da proposta de entregar a gestão das unidades estaduais de saúde a uma OSCIP. Qual o custo para nossos bolsos? Isso promoverá inclusão ou uma maior exclusão do nosso povo pobre – não menos favorecido – as políticas públicas?
O programa passará a integrar as diretrizes orçamentárias de Roraima, podendo promover o corte de investimentos em áreas e setores não mencionados no planejamento proposto. Apesar de apresentar que o Programa Roraima 2030 deverá perseguir metas e indicadores, os quais não integram o projeto de Lei, o monitoramento terá caráter apenas gerencial e informativo, não há obrigatoriedade de alcançar as metas sigilosas. Igual a terceirização da gestão do HGR e dos milhões em renúncia fiscal aos produtores de grãos e gado.
A proposta prever que o programa consiste em um planejamento decenal. Isso é um avanço para nosso Estado, apesar da proposta atual possuir claro objetivo de potencializar o papel da aristocracia agrária no Estado, sem promover efetivas ações de inclusão social e econômica da classe trabalhadora. Enfim, o Roraima 2030 não promoverá transformações, apenas acentuará as desigualdades, pois reproduz o mesmo modelo de gestão implementado nos últimos 4 anos. A proposta se consolida em uma peça publicitária para fotos e pagamento de curtidas nas redes sociais.
ÚLTIMO JARDIM
O fotógrafo Wank Carmo inaugurou, na última quarta-feira no setor cultural do SESC mecejana, uma exposição fotográfica que reproduz um olhar sobre o jardim natural que representa a Amazônia com seus diversos espaços, bem como um olhar sobre a destruição antrópica promovida dia-a-dia. Na abertura do evento houve um bate papo com estudantes retratando a existência do artista na Amazônia e sua vontade em contribuir com a construção da defesa deste Último Jardim, assolado por culturas agrícolas, garimpo e desmatamento para auferir lucro, sobre o sangue de pessoas. Esse projeto de reprodução do capital secular impõe destruição e morte, sendo nossa a responsabilidade a reversão do atual quadro e seu direcionamento para outras possibilidades que promova a defesa da vida da floresta e de seus povos. A exposição estará aberta até o dia 31/03/2023, aproveite para refletir um pouco entre o verde das folhas, o marrom dos troncos, o laranja das queimadas e o brilho da arte viva.
ARTE INDÍGENA CONTEMPORÂNEA
Hoje, 19:30h, no Espaço Cultural Paricá, localizado na rua João de Alencar, 2172, aeroporto, o jornalista Paulo Thadeu estará fazendo o pré-lançamento de mais uma produção literária. As novas letras apresentarão um conceito criado pelo nosso querido Jaider Esbell que define a Arte Indígena Contemporânea como um contraponto a indústria cultural, refletindo um chamado além da arte, consiste numa representação em defesa da vida. Além de participar desse belo encontro da literatura com o estudo científico poderás encontrar obras de vários artistas em exposição e artesanatos indígenas. Vamos “sextar” com valorização da nossa cultura. Aguardo você.
Bom dia. Um forte abraço.
Fábio Almeida
Jornalista e Historiador
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