O Brasil possui uma estrutura muito injusta para seu povo. A elite política e econômica sempre utilizou o Estado para garantir seus privilégios, alçados a grande potencialidade durante os períodos de exceção, os quais não foram poucos. Neste quadro geral a luta pela retomada da democracia impôs ao Estado, por meio de uma grande pressão popular, o que se denominou uma Constituição Cidadã.
Um dos principais ganhos sociais foi a definição de percentuais mínimos de investimentos em educação e saúde. Atualmente todas as esferas de governo são obrigadas a investir 25% no sistema educacional, já na saúde os percentuais variam de 10% a 15%, conforme o Ente federado. Essa determinação constitucional trouxe ganhos importantes ao povo, pois o sistema de educação e saúde até 1988 possuía características centrais em torno da contratação de serviços privados e não havia vinculação de recursos a esses gastos.
Nos anos posteriores, apesar da corrupção, tivemos a universalização dos serviços de saúde e educação, permitindo que os padrões de vida de nosso povo melhorassem significativamente, garantindo por meio desses serviços um processo de ampla inclusão cidadã. Assim, avançamos apesar dos ataques a essa política social crescer a cada ano, após o golpe parlamentar de 2016. Chegamos, portanto, em um momento de uma crise política que possui condições de reverter essa determinação constitucional, largando os filhos e filhas da classe trabalhadora a própria sorte.
Grande parte da elite política e empresarial brasileira acredita que a vinculação de recursos em ações educativas e de saúde consistem em gastos desnecessários. Esse mesmo coletivo, no entanto, defende a vinculação de recursos para gastos financeiros, como foi garantido no arcabouço fiscal aprovado no governo Lula. A nova regra fiscal estabeleceu que 30% de toda a arrecadação será garantida aos bancos. Em 2023, isso significou R$695,4 bilhões. Com educação tivemos uma despesa de R$100,8 bilhões e com saúde foi dispendido um total de R$149,9 bilhões, perfazendo essas duas despesas da União R$250,7 bilhões, ou seja, em 2023 gastamos 63,95% a mais de recursos com os bancos do que com educação e saúde. Isso é a efetividade do Estado mínimo na garantia do financiamento dos mais ricos em detrimento de nosso povo.
Agora a banca pressiona, por meio do congresso nacional e da imprensa, o fim da vinculação dos recursos da educação e saúde, a fim de garantir mais recursos para o capital financeiro. O pior é que setores do governo, especialmente nos ministérios da fazenda e planejamento, são seduzidos pela proposta, demonstrando a captura de parcela do governo com o programa neoliberal que é majoritário no âmbito do congresso nacional. A questão central é como enfrentaremos esse cabo de guerra?
Partidos progressistas que formam a base do governo Lula acreditam em sua grande maioria que tomar as ruas contra essas propostas é fortalecer a extrema direita. Essa é uma leitura equivocada da disputa do Estado, pois desmobiliza uma base importante das classes populares e abre uma vertente política para que a extrema direita que defende esse corte possa demagogicamente mobilizar o povo contra o governo.
Essas medidas devem ser observadas pelos movimentos sociais como um polo aglutinador de debates e mobilizações da sociedade a esquerda, fundamentalmente precisamos disputar o Estado brasileiro e o seu arcabouço institucional, caso contrário, veremos cada vez mais partidos do campo da esquerda concedendo princípios para se manterem no poder político, mesmo que para isso sacrifiquem a classe trabalhadora. A defesa do investimento mínimo em educação e saúde deve ser uma bandeira concreta da luta de nosso povo, independentemente da posição adotada pelos partidos do campo progressista.
Já a esquerda revolucionária possuirá um campo importante de trabalho com essa guinada neoliberal que pode ser adotada pelo governo federal, possibilitando uma boa capacidade de articulação popular, não apenas por meio do denuncismo do atual governo, mas construir uma centralidade em torno do papel do Estado, capturado historicamente para atender os interesses da burguesia, a qual tenta retirar as poucas migalhas destinadas ao povo em geral. O enfrentamento não pode ser fulanizado, deve ser contra a ordem, contra o establishment.
Enfim, teremos nos próximos meses um amplo debate político que potencializará o processo de perda e ganhos. Nossa capacidade de mobilização é que determinará como sairemos dessa quadra. No entanto, a capacidade de interlocução popular com esse tema do financiamento da saúde e da educação permitirá aos movimentos sociais e aos partidos do campo da esquerda e do progressismo assumirem um papel protagonista. Claro, se tivermos coragem de enfrentar esse debate.
Mais um calote do governo Denarium
A boca miúda rola um buchicho de que os atrasos no pagamento de notas fiscais são propositais na gestão de Denarium, o Cassado. Desta forma, possibilidades outras surgem, a exemplo do que vivenciamos no governo do PP, quando governou Roraima entre 2014 a 2018. Essa gestão é repleta de denúncias de corrupção, especialmente na pasta da saúde que já sofreu inúmeras operações policiais e teve recentemente a titular condenada por direcionamento de processos licitatórios.
O mais novo ruído surge da empresa ISM responsável pelo fornecimento de alimentação aos estabelecimentos de saúde administrados pelo governo do estado. Segundo questionamentos da prestadora de serviços, o governo deve a empresa, em faturas atrasadas R$12,6 milhões, situação que compromete a efetividade da prestação dos serviços. A alimentação hospitalar, nos últimos 10 anos, passa por vários processos de malversação de recursos públicos, tendo em vista que na prática são parlamentares estaduais que ganham esse fornecimento.
Como sempre a SESAU afirmou que tudo está sendo pago, neste caso a denúncia da empresa, apresentada na ouvidoria da pasta, é uma mentira. Algo que não acho ser concreto, pois qual o sentido uma prestadora de serviços questionar dívidas que não existe. A questão central é se os buchichos forem verdadeiros a empresa não aceitou as propostas e teve suas faturas atrasadas retidas, colocando em risco a qualidade da alimentação dos roraimenses internados, sendo a responsabilidade do governador Denarium que mantém uma secretária de estado ineficiente que responde a múltiplas investigações de desvio de dinheiro público.
Reggae
Ao completar 25 anos de estrada, com seus primeiros shows no malocão do DCE/UFRR, a banda Guy-Bras-Ven participou do October Reggae Festival, realizado em Salvador, e recebeu o prêmio de segundo lugar na votação popular como uma das melhores bandas que se apresentaram no evento. A conquista desta premiação para Roraima é a consolidação do caráter cosmopolita de nossa cidade que possui em sua gênese uma capilaridade importante na formação de nosso povo. Parabéns a todos os envolvidos neste maravilhoso reconhecimento da cultura roraimense, também forjada no suingue do reggae.
Genocídio
A fala do Ministro da Segurança Nacional de Israel, Ben-Gvir, deixa claro que o objetivo central do sionismo de extrema-direita que governa o país é expulsar os palestinos da região. A ação militar contra Gaza já computa mais de 42 mil mortes, a grande maioria de mulheres, idosos e crianças, em uma luta onde um exército oprime um povo que vive sobre bloqueio econômico desde o ano de 2006.
O que temos na prática é o expansionismo de um supremacismo étnico baseado na ideia da “grande Israel”, defendida por frações do sionismo que querem expandir o território do país sobre as bases históricas e seculares dos povos árabes. Segundo a ideia central área da Síria, Líbano, Egito e Iran pertencem ao povo de Israel, segundo os ensinamentos do antigo testamento.
Esse processo de expansão não é novo, consiste numa perspectiva política calcada na prática sobre um protocolo de limpeza étnica que assistimos ao vivo em Gaza e na Cisjordânia. Ontem, 2 ministros do governo israelense participaram de um evento denominado “Preparando-se para reassentar Gaza”, onde a linha central é permitir que israelenses possam ocupar as áreas que foram dizimadas pelos ataques aéreos, com bombas financiadas pelo ocidente.
Em uma das falas a autoridade afirma que “oferecemos a eles a oportunidade de mudarem para outro país, pois essas terras são nossas”. Esse tipo de atitude, sem punição exemplar do TPI a quem dissemina essas ideias permite a reformulação do conceito de genocídio que se estabelece não apenas pela prática de assassinatos em massa, mas também pela prática de expulsão de um povo de sua terra, duas ações implementadas pelos sionistas em Gaza.
Risco socioambiental
O conselho nacional de direitos humanos publicou uma resolução solicitando que o governos federal e os estaduais do Pará e Mato Grosso suspendam os atos administrativos da construção de uma linha férrea que ligará Sinop (MT) a Miritituba (PA), conhecida como Ferrogrão prioriza o transporte das comodities agrícolas destinadas a exportação, a exemplo da soja e do milho. Segundo o CNDH as consultas prévias, livres e informadas junto as comunidades indígenas, quilombolas e tradicionais não foram realizadas como determina a legislação brasileira, expondo a vida dessas comunidades a riscos permanentes.
A demarcação de terras indígenas na área impactada pela obra também é cobrada pelo colegiado de direitos humanos, além de um plano de proteção a bacia do rio Tapajós, impactado pela ampliação da seca, proporcionada pelo desmatamento proliferado pelo avanço da fronteira agrícola no Cerrado e na Amazônia. A ultima recomendação aponta a necessidade de tombamento do sítio arqueológico Santarenzinho, uma área sagrada para povos indígenas da região. A posição do CNDH é importante por pautar que ações estruturais não podem impor sofrimento de povos que residem nas áreas de impacto.
PL da Regularização Urbana
O governo do Estado encaminhou em 31/01/2024, o PL 09/2024 que dispõe sobre a alienação e regularização fundiária de imóveis urbanos que pertençam ao Estado. A proposta traz no seu bojo conceitos inovadores na administração pública. Em primeiro lugar estabelece como critério de caracterização de uma área urbana a existência de no mínimo 50 pessoas morando em 1 hectare de terra, somado a existência de 2 dos serviços: drenagem de águas pluviais, esgotamento sanitário, abastecimento de água, distribuição de energia elétrica e manejo de resíduos sólidos. Outra inovação é a caracterização de famílias de baixa renda como aquelas que recebem até 5 salários-mínimos.
A legislação estabelece 4 formas do Estado se desfazer de suas terras: a) doação; venda; concessão de uso especial para moradias; e concessão de uso especial para fins comerciais. Essas concessões podem ser, conforme estabelece a Lei, realizadas por tempo indeterminado, ou seja, para sempre. A responsabilidade pela gestão é atribuída ao Iteraima.
O artigo 10 e 17 flagrantemente são inconstitucionais pois autorizam o governo do estado a promover desfazimento de imóveis urbanos que integram o patrimônio da administração indireta, essa prática consiste em crime de responsabilidade, tendo em vista que o regramento do patrimônio das administrações indiretas é distinto do patrimônio do Estado. A Lei permite o governador doar até 1.000m², um terreno de 20X500, inclusive permitindo que famílias ricas possam receber suas terras gratuitamente.
Essa medida gerará um passivo enorme para o Estado, tendo em vista que muitas famílias que regularizaram seus imóveis tiveram que arcar com custos elevados. A doação deveria se restringir as famílias de baixa renda, tendo os demais que pagar pela compra da terra. Empresas altamente lucrativas podem ter as terras recebidas gratuitamente, esse um ato lesivo ao patrimônio do Estado.
Já o artigo 18, da proposta legislativa do governador Denarium, prevê a venda direta, sem licitação de até 3.000m² a um mesmo beneficiário, seja uma área contigua ou não. Já o parágrafo único do artigo 21 quer que proprietários que compraram imóveis na época do Território Federal de Roraima tenham que pagar novamente pelo bem. Já o artigo 22, prevê que o Estado possa comercializar terras em áreas definidas como de interesse social. Ou seja, a proposta permite o governo retirar áreas para construção de cassas populares e comercializar as terras com pessoas ricas.
No parágrafo 2º, do artigo 23, Denarium concede um abatimento de 50% do valor do imóvel que tiver pagamento a vista, mais um presentinho aos mais ricos. O inciso segundo, do artigo 27, impede que famílias que possuam lotes rurais possam receber por meio da concessão real de uso imóveis urbanos do Estado, situação delicada, tendo em vista que muitas famílias assentadas mantêm imóveis rurais e urbanos, especialmente em virtude da precariedade do acesso a educação e a saúde.
O artigo 38 regulamenta a realização de processos licitatórios para áreas maiores que 3.000m², no entanto o texto estabelece que a preferência é de quem ocupou de forma pacífica a terra pública por no mínimo 1 ano de forma ininterrupta. O artigo 44 prevê que as pessoas que ocupem terras do Estado de forma pacífica poderão ser notificadas por meio do DOE, podendo essas famílias serem expulsas de suas terras caso não respeitem os prazos.
Esse projeto de Lei encontra-se na pauta de votação da sessão ordinária da Ca$a Legi$lativa no dia de hoje. A proposta consiste em um amplo processo de desfazimento de terras públicas, a exemplo do que foi feito na área rural, por Denarium. O projeto ampliará a concentração de terras em nossas áreas urbanas, tendo em vista que a proposta não trabalha com a manutenção de reservas técnicas para implantação de residências de interesse social.
Bom dia, com alegria.
Fábio Almeida
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